Texto:

I'sis Almeida

É jornalista e bacharel interdisciplinar em artes pela UFBA. Criou em 2014 a página Black Fem no Facebook que chegou a reunir mais de 20 mil seguidores. Criadora do Se Organiza, Bonita! - comunidade e podcast sobre organização pessoal para mulheres negras e pessoas periféricas onde atua como consultora e mentora.

Ilustração:

Lavínia Oliveira

Lavínia Oliveira é artista e designer, apaixonada por música e tecnologia, busca constantemente por novas perspectivas e abordagens multidisciplinares. Esses universos são evidenciados em suas criações que abraçam a inovação e transmitem uma energia singular, por meio de experiências que mesclam criatividade e os campos da comunicação.

Responsabilidade afetiva

Por: I’sis Almeida

Colagem: Lavínia Oliveira/Portal Black Fem — Todos Direitos Reservados, jamais reproduza sem os créditos

O psicanalista Christian Dunker, autor do livro “A Reinvenção da Intimidade: Políticas do Sofrimento Cotidiano”, diz: “Não podemos ser subornados pelo amor, porque nos tornamos inconsequentes. Assim como não podemos ser subornados pelo ciúme, pelo ódio, pela inveja, por nenhum afeto, pois assim nos tornamos irresponsáveis afetivamente”.

Para Jalene Silva, psicóloga e especialista em relacionamentos, a responsabilidade afetiva traz a reflexão de não entregar aquilo que não podemos cumprir. A especialista acredita que, diante das projeções que destoam da realidade e do que prometemos, existe a satisfação do ego para conseguir alcançar algo construído pela nossa projeção. “Seja em construções no ambiente de trabalho, nos estudos, nas relações de afeto, sexo, amizades e até mesmo nas relações familiares”, completa.

É ela quem cita Dunker para elucidar os limites das relações, sejam elas afetivas ou não. A palavra responsabilidade, segundo Silva, vem atribuída aos estudos e publicações do curso de Direito. O ato de se responsabilizar pelos seus atos demonstra limites de como o sujeito merece ser respeitado, sem precisar invalidar os seus próprios sentimentos.

“Nos dias atuais, os sujeitos utilizam o termo em inglês chamado ‘ghosting’ (derivado da palavra ghost, que significa fantasma), usado para se referir ao término repentino de uma relação sem deixar explicações, sem ter responsabilidade com os afetos. A diferença é que antigamente as pessoas iam ‘comprar cigarros e nunca mais voltavam’ e agora o ato de bloquear ou não responder mensagens é uma demonstração de desinteresse”, conta a psicóloga.

A verdade como eixo central da comunicação em relações saudáveis

Numa relação saudável, onde há responsabilidade afetiva, a verdade se apresenta como eixo central da comunicação entre duas ou mais pessoas. Essa é a perspectiva que Jaciana Melquiades, escritora, empresária e criadora do podcast “Eu Preciso Falar de Amor”, aborda em um dos episódios do programa de áudio que fala sobre o amor em diferentes perspectivas.

Para Jaciana, responsabilidade afetiva é o compromisso de deixar o outro ciente do que se deseja, do que se intenciona e também “do que se entende como perspectiva de futuro com aquela outra pessoa”, explica. “Tem uma confusão entre responsabilidade afetiva e correspondência afetiva. A responsabilidade é justamente deixar o outro ciente e aí não necessariamente o que a gente vai dizer vai ser bom de ouvir”, completa.

Ao debater sobre o assunto, em entrevista para o Portal Black Fem, Jaciana enfatiza que seu intuito é orientar que ser responsável está diretamente ligado à honestidade e à coragem de construir espaços saudáveis de comunicação.

Para a escritora, portanto, a responsabilidade afetiva está numa seara mais radical, isto é, numa categoria de atitude mais radical. “Comunicação saudável não é necessariamente em conformidade com o que eu quero ouvir, mas é o que não engana, não ludibria, o que não deixa alguém estar num relacionamento sem enxergar as verdadeiras intenções do outro.”

O que a traição dentro de um relacionamento tem a ver com responsabilidade afetiva?

Jaciana explica que descobrir uma traição “coloca a gente num lugar de quebra de acordo, de desconforto, e aí se a gente não está muito bem organizada, entra numa onda de comparação, de ficar buscando onde erramos naquela relação, por que aquela pessoa foi buscar fora o que não tem na relação. E assim, a gente começa a se diminuir”. “Na prática, esse movimento de quem trai em ir buscar uma conexão sexual ou de qualquer outro cunho fora do relacionamento, estando fora dos acordos pré-estabelecidos do casal, tem a ver com uma falta de caráter da pessoa que não tem capacidade de ser honesta sobre seus próprios desejos”, conclui a podcaster.

Para Jalene, a traição, especialmente quando se torna pública, é um tema que gera comoção e diversos gatilhos para as mulheres porque mexe com a confiança e o valor que elas dão a si mesmas. “Especialmente para as mulheres negras, como eu, esse impacto é ainda maior. Porque, historicamente, fomos ensinadas a resistir, a lutar pelo nosso lugar, nos apoiando nas relações afetivas para nos fortalecer, muitas vezes criando uma dependência nas relações para validar nossas conquistas.”

Quando acontece uma traição, existe uma quebra de acordo que reafirma as inseguranças, traumas de abandono, como uma espécie de memória de resgate ao que as ancestrais das mulheres negras já viveram, explica Jalene Silva. “É mais uma memória de violência, por ser um lembrete doloroso das vezes que fomos desvalorizadas e invisibilizadas. Por isso, a traição vai além da infidelidade, ela enterra o dedo em feridas que são profundas, trazendo à tona o sentimento de rejeição e medo de não sermos suficientes.”

É preciso falar abertamente sobre responsabilidade afetiva

Em entrevista para o Portal Black Fem, Jalene detalha que pacientes com quadros de auto abandono, como no transtorno depressivo, mostram que, por algum sofrimento, a pessoa deixa de se comprometer com si própria, com os relacionamentos e com as atividades que desempenha. “Um sujeito com quadro psiquiátrico ou doenças psicossomáticas pode manifestar uma certa irresponsabilidade em relação a si ou ao outro e ter dificuldade de discernir os limites. Por exemplo, sendo negligente consigo mesmo, o sujeito se desorganiza e prejudica as pessoas que o amam”, elucida a psicóloga.

Questionada sobre como na nossa sociedade é possível praticar a responsabilidade afetiva, Jalene detalha que é preciso estar alinhado à honestidade, empatia e respeito mútuo. E concorda com o já exposto por Jaciana Melquiades. Para a psicóloga, a comunicação tem que ser transparente e sincera, e as relações precisam estar abertas a expor os sentimentos, expectativas e limites, evitando jogos emocionais e manipulações.

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